Eu e o outro que me habitamemória e criação em Le Clézio
memória e criação em Le Clézio
Palavras-chave:
identidade, cultura, alteridadeResumo
J.M.G. Le Clézio, em sua obra O africano apresenta, biográfica e sensivelmente, uma viagem iniciática que propõe reconquistar ou buscar as lembranças de infância, do pai, das origens de um menino-personagem-filho que voltou atrás, à África, às Ilhas Maurício, aos confins de Camarões e da Nigéria, para se reconhecer, reconhecendo as sombras deixadas pelo pai. Nessa obra, o autor desvenda uma experiência múltipla que, de um lado, desenha um estrangeiro, em uma França que o acolhe sem, no entanto, reconhecê-lo. Por outro lado, esse mesmo personagem, busca, para se compreender em uma sobrevivência ambígua, colonizadora e colonialista ao mesmo tempo, artifícios sutis de apagamento das heranças identitárias e familiares, de forma que as origens e as influências de uma cultura adquirida nos muitos anos de infância vividos na África são transformados em invenção, em histórias criadas para apaziguar as angústias resultantes desse estranhamento existencial e não compreendido. Trata-se, na verdade, de uma promessa e de um compromisso com uma harmonia perseguida na reconstituição de um enigma memorial-imagístico que promove a consciência da alteridade a partir do reconhecimento de sinais herdados e adquiridos na dupla, dolorosa e sempre renascida identidade. Nesse sentido, o trabalho aqui proposto pretende desvelar os caminhos de uma narrativa ancorada nas lembranças da memória e na criação de identidades, de forma a propor uma leitura – ainda que individual e distanciada pela intimidade com o eu ficcional – de recuperação ou delineamento de experiências culturais e estruturantes de um viver contemporâneo.